O Fisco pode acessar nossa movimentação bancária livremente?

Repercutiu nos últimos dias o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, de cinco ADIN´s que combatiam a constitucionalidade da Lei Complementar 105/2001, que “dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras e dá outras providências”, rejeitando as alegações contra a lei.
Em meio à crise política e econômica, e concatenado com outro julgamento rumoroso, que diz respeito à execução de pena de prisão antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, o assunto serviu para a disparada de teorias conspiratórias e especulações.
Ainda que pendente a publicação do acórdão, alguma observações devem ser feitas sobre a questão do sigilo bancário e o julgamento.
A Lei Complementar nº 105 é de 2001, contando com quinze anos de vigência. Ela confere à União o poder de exigir das instituições financeiras que lhe informem à Receita Federal as operações financeiras efetuadas pelos usuários dos serviços bancários, sejam eles depósitos à vista e a prazo, inclusive em conta de poupança; pagamentos efetuados em moeda corrente ou em cheques; emissão de ordens de crédito ou documentos assemelhados; resgates em contas de depósitos à vista ou a prazo, inclusive de poupança e quaisquer outras operações de natureza semelhante.
Trata-se de uma massa de informações identificadas apenas por CPF/CNPJ e os montantes globais mensalmente movimentados.
Com base nessas informações, pode a Receita Federal, se detectados indícios de falhas, incorreções ou omissões, ou de cometimento de ilícito fiscal, requisitar as informações e os documentos de que necessitar, bem como realizar fiscalização ou auditoria para a adequada apuração dos fatos.
Outra autorização que essa lei dá é para que os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios examinem documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.
A Lei é regulamentada por dois Decretos Federais, o 4489/02 e o 3724/01, que especificam e corroboram o texto genérico da Lei.
Portanto, em resposta à pergunta título desse artigo é SIM, pode o Fisco acessar nossa movimentação bancária livremente, com base no que aparentemente decidiu o STF (certeza, somente com o acórdão).
A segunda questão, sobre a qualidade do julgamento, quer me parecer que a discussão sobre necessidade de prévio requerimento judicial esconde a discussão fulcral sobre a matéria, que é o respeito ao contraditório e à ampla defesa, e ao devido processo legal, que podem estar ameaçados, a depender da forma como a autoridade administrativa exerce o poder que lhe foi conferido.
Isso porque a Lei não exige que, antes de acessar a completude das informações do cidadão, seja ele intimado para apresentá-las e prestar esclarecimentos sobre a dúvida ou suspeita que têm a autoridade fiscal. E isso retira do cidadão, e de qualquer autoridade judiciária, o poder de fiscalizar o Fisco no acesso a essas informações, e a História nos mostra que os Estados e os soberanos devem ser fiscalizados mediante mecanismos transparentes e acessíveis.
Não há como evitar, portanto, com base nesse entendimento, que sem que o cidadão ou qualquer autoridade tome conhecimento, a União pratique devassas para fins políticos, persecutórios, econômicos, concorrenciais.
Aguardemos, entretanto, a publicação do acórdão, a ver como essas questões foram enfrentadas pelos Eminentes Ministros.
E que venham os Embargos de Declaração.

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